Disputas à bala, sangue e assassinatos resumem o atual panorama da milícia no Rio de Janeiro. Os confrontos se acirraram desde a morte de We...
Disputas à bala, sangue e assassinatos resumem o atual panorama da milícia no Rio de Janeiro. Os confrontos se acirraram desde a morte de Wellington da Silva Braga, o Ecko, há exatamente um mês.
Como mostrou o RJ2 nesta segunda-feira (12), nas últimas semanas ao menos quatro ataques deixaram sete mortos no Rio e na Baixada Fluminense, o que revela uma briga pelos territórios.
Só que o grupo de Ecko apontado como o chefe e principal nome da principal milícia que age no estado, já vinha rachando desde o ano passado. Veja a linha do tempo abaixo:
23 de junho – Um ex-PM é assassinado em Campo Grande e o corpo some;
26 de junho –Outro PM é morto com vários tiros de fuzil, também em Campo Grande;
29 de junho – Ataque no Terreirão, Recreio, deixa três mortos e cinco feridos;
30 de junho – Durante aula de crossfit, em Nova Iguaçu, dois são mortos e dois ficam feridos.
Disputa antes de Ecko morrer
Mesmo antes de o chefão morrer, uma disputa dentro do próprio grupo de Ecko já tinha começado, o que provocou mudanças nos territórios da milícia no Rio. Ecko comandava principalmente a Zona Oeste da cidade, nos bairros de Paciência, Campo Grande, Santa Cruz e Guaratiba.
Um dos principais comparsas dele, Danilo Dias Lima, o Tandera, ficava com parte da região da Baixada Fluminense. Campinho e Praça Seca, considerados pela polícia bairros onde ficam os quartéis-generais da milícia, ficava com um outro aliado: Edmílson Gomes Menezes, o macaquinho.
As investigações da polícia apontam que a aliança entre o trio começou a ruir no fim do ano passado.
Divisão pelo tráfico
Ecko – que sempre comandou uma organização criminosa violenta – não gostava de um crime: tráfico de drogas. Segundo a polícia, ele queria viver uma vida inspirada nos bicheiros dos anos 1970.
Graças à ligações locais entre milicianos e traficantes, a droga começou a fazer parte da rotina da milícia. "Bocas de fumo" surgiam em territórios dos milicianos, o que fez as autoridades de segurança pública a classificarem esses grupos como "narcomilícia".
O tráfico começou a chegar em territórios ligados a Ecko. Tanto na Baixada Fluminense – na região dominada por Tandera – quanto em Campinho e Praça Seca, dominada por Macaquinho.
No Rio, as relações eram ainda mais próximas de Macaquinho com uma liderança de uma das facções do tráfico, o chefe do Complexo da Serrinha, em Madureira, Zona Norte, Wallace Brito Trindade, o Lacoste.
"Efetivamente quem começa a ligação milícia trafico é o Macaquinho no Campinho. Temos informações e constatamos isso, de efetivamente ele fazer isso para proteger e também para vender droga. E surge que o Ecko seria contra isso, e portanto todo esse racha no ano passado", explicou o delegado William Pena Júnior, titular da Draco.
O estopim
O trio Ecko, Tandera e Macacaquinho começou a se estranhar. O estopim para o racha veio em outubro do ano passado. Na noite do dia 15, um bonde com quatro carros da milícia foi interceptado por equipes da Polícia Civil e da Polícia Rodoviária Federal na BR-101, em Itaguaí.
Naquele dia, 12 milicianos morreram, incluindo uma liderança da quadrilha. Os chefes da milícia começaram a desconfiar um do outro, acreditando em um suposto vazamento da informação.
Este ano, a Secretaria de Administração Penitenciária teve que separar os grupos em Bangu 9, presídio destinado a milicianos: 360 presos ligados a Ecko foram para um lado e 150 das quadrilhas de Tandera e Macaquinho ficaram do outro. Parte se manteve neutra.
A volta de Toni Ângelo
Em março, um outro personagem volta à cena do crime no Rio. O ex-PM Toni Ângelo Souza de Aguiar, o Toni Ângelo, voltou a cumprir pena em Bangu. Ele estava há oito anos em presídios federais.
Antigo miliciano da Zona Oeste, ele chefiava o bando de Ecko antes de ser preso. Investigações apontam que Toni Ângelo recebia uma mesada da quadrilha. Mas, em agosto de 2020, o irmão dele foi executado em Belford Roxo, na Baixada Fluminense.
Investigações da Draco, a Delegacia de Repressão ao Crime Organizado, indicam que o mandante foi Ecko, o que fez o ex-PM mudar de lado e passou a se aproximar do grupo de Tandera.
Em imagens exclusivas obtidas pelo RJ2, Toni Ângelo aparece conversando no telefone por meio de um aplicativo com um aliado. Tudo isso de dentro do Complexo de Bangu. Relatórios de inteligência apontam que ele estaria falando com um miliciano do grupo de Tandera.
Com Ecko fora do jogo, as disputas decretaram de vez o fim da aliança. A Seap confirma que dividiu mais uma vez os milicianos, desta vez separando os grupos de Macaquinho e Tandera. Esse suposto racha ainda está sendo investigado.
Ataque no Terreirão
O ataque a tiros no Terreirão, no Recreio dos Bandeirantes, no fim do mês passado, pode ter sido o motivo para a ruptura. Três foram mortos, dois estavam ligados a Tandera. O músico Jean Carlos dos Santos, de 22 anos, vítima do ataque, era inocente.
Outras peças também começaram a surgir. Uma delas é Ygor Rodrigues Santos da Cruz, o Farofa. Ele foi flagrado por câmeras de segurança fazendo cobranças no comércio do Terreirão.
Farofa está foragido desde que participou da execução do bicheiro Fernando Iggnácio, num heliponto do Recreio. A polícia afirma que ele é braço direito do miliciano Rafael Luz Souza, o Pulgão.
Pulgão era policial civil e foi preso em 2018, com metralhadora antiaérea e cinco fuzis na saída de uma boate na Barra da Tijuca. Ele teria se aliado a Toni Ângelo e Danilo Tandera. Como farofa se aliou a Macaquinho, os investigadores tentam decifrar esse racha, e de que lado cada um está.
"O elemento farofa, já detectamos que no dia do evento no Terreirão, ele tava na região. A gente quer saber se ele era o alvo perseguido ou se ele participou na emboscada de milicianos daquela região", acrescentou o delegado da Draco.
Herdeiro de Ecko
A polícia afirma ainda que o irmão de Ecko, Luís Antônio da Silva Braga, o Zinho, herdou parte da milícia da Zona Oeste. Empresário do ramo de terraplanagem, ele chegou a ficar afastado da milícia durante anos.
Agora, será o terceiro da família a assumir o controle da milícia – gestão que começou com o antecessor de Ecko, Carlos Alexandre da Silva Braga, o Carlinhos Três Pontes, também morto pela polícia, em 2017.
E cada rodada desse jogo coloca em risco moradores, comerciantes. A população, que é a verdadeira dona desse território.
Via G1