A falta de notícias sobre as três crianças desaparecidas em Belford Roxo, na Baixada Fluminense, é a principal causa de angústia para as fam...
A falta de notícias sobre as três crianças desaparecidas em Belford Roxo, na Baixada Fluminense, é a principal causa de angústia para as famílias. Os meninos Lucas Matheus, de 8 anos, o primo dele, Alexandre da Silva, de 10 e do amiguinho dos dois, Fernando Henrique, de 11, moradores no bairro Castelar, sumiram no último dia 27. Desde então o programa SOS Crianças Desaparecidas, da Fundação de Apoio à Infância e a Adolescência (Fia), recebeu 73 denúncias, sendo 3% falsas e a maioria inconsistentes. Os parentes dos garotos receberam informação de que eles foram vistos pela última vez na Feira de Areia Branca, no bairro de mesmo nome, no dia do desaparecimento, mas a polícia não confirmou.
Pistas falsas levaram os familiares das crianças a diferentes locais, como Campo Grande, Santa Cruz, Central do Brasil e Flamengo, todos no Rio. Não bastasse isso, a mãe de um dos garotos contou que foi vítima de uma tentativa de extorsão. Camila Paes da Silva, de 29 anos, mãe de Lucas, contou que neste domingo uma amiga dela recebeu uma mensagem de texto de um desconhecido dizendo saber do paradeiro da criança, mas pedia dinheiro pela informação. A mulher fez um print da conversa para encaminhar à polícia.
—Um homem mandou uma mensagem para minha amiga, falando que tinha achado Lucas e queria algo em troca para devolver, que era dinheiro. Quando ela pediu para ele mandar uma foto do menino, o homem bloqueu ela — contou Camila.
A irmã dela, Rana Jessica da Silva, de 30 anos, mãe de Alexandre contou que os momentos mais difícieis do dia são à noite, na hora de dormir. Ela contou que nessa hora fica angustiada em pensar que o filho possa estar passando necessidade.
— Fico imaginando se ele está bem, se está dormindo direito. Quem estiver com ele, que solte porque a gente está sofrendo, a família está sofrendo. E eles também, com certeza, estão sofrendo — desabafou.
A situação enfrentada por essas mães está longe de ser um caso isolado. Desde que foi criado há 25 anos, o SOS Crianças Desaparecidas já ajudou a localizar 3.191 crianças, mas ainda acumula 578 casos sem solução. Números do Instituto de Segurança Pública (ISP), que não distingue quantos são crianças, mostram que entre janeiro a novembro de 2020 foram registrados 3.042 desaparecimentos no Estado do Rio de Janeiro. O volume é 31% menor em relação ao mesmo período de 2019.
No domingo, familiares das crianças fizeram um protesto cobrando uma solução para o caso. Na tarde desta segunda-feira, familiares e coleguinhas dos desaparecidos foram ouvidas na Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense (DHBF), que investiga o caso, através do Setor de Descoberta de Paradeiros. O delegado Uriel Alcântara negou que as investigações só tenham começado oito dias depois do sumiço das crianças. Ele garantiu que os primeiros depoimentos foram colhidos logo no dia seguinte e que a polícia já fez diligências em mais de 30 locais, com a coleta de imagens de câmeras onde havia o equipamento.
— Teve dias que fomos a 12 lugares para diligências. Familiares reclamaram e acham que não está sendo feito nada, porque na verdade não foram ouvidos. Alguns depoimentos foram formalizados só hoje e eles disseram a versão deles. Hoje os depoimentos dos familiares foram mais objetivos e esclareceram algumas contradições. Eles precisavam esclarecer alguns pontos, mas o mais importante foi ouvir algumas crianças que tiveram contato com os três desaparecidos — justificou o delegado, que não descarta nenhuma hipótese para o sumiço dos meninos. — a gente não tem nenhum dado concreto de onde elas passaram. É um caso um pouco atípico, porque não tem nenhuma informação concreta sobre por onde eles passaram chegou para a gente. Segundo a família disseram que viram eles na feira, mas a gente não encontrou imagens que tenham registrado eles nem encontramos testemunhas que tenham efetivamente visto o trio e possa confirmar isso de forma inequívoca.
A informação de que as crianças podem ter entrado numa mata para caçar passarinho, passada por um familiar ao SOS Crianças Desaparecidas, por meio de áudio não é desprezada pela polícia. Porém, é considerado um cenário periférico de buscas e não principal, já que as informações recebidas através dos depoimentos não indicam que eles tenham ido para lá, segundo o delegado. O local é controlado por traficantes. O delegado não descarta uma varredura no local.
A polícia está apurando também a tentativa de extorsão a uma das famílias, mas acredita se tratar de alguém que quisesse se aproveitar da situação para aplicar um golpe. O delegado disse que a polícia recebeu muitas informações de possíveis locais e analisou diversas imagens de câmeras, mas nenhuma mostrava as crianças.
Lucas e Alexandre foram criados juntos há até dois anos, na casa da avó num condomínio do Minha Casa, Minha Vida. A mãe do primeiro se mudou para outro imóvel no mesmo local e a proximidade fez com que mantivessem o hábito de brincar juntos, praticamente todos os dias, já que as aulas estão suspensas, por conta da pandemia. Mas. era comum voltarem para casa na hora do almoço, o que não aconteceu no último dia 27 e chamou a atenção das mães.
Camila contou que as crianças estavam jogando bola e, como estava sujo Lucas foi em casa tomar banho, colocou outro short, mas tornou a sair, sem camisa. Quando ela deu pelo desaparecimento do filho, mais tarde, recebeu várias informações, infundadas de locais onde os meninos teriam sido vistos por último, mas a feira foi o único que se confirmou.
Lucas tem duas irmãs de sete e quatro anos, que segundo Camila não param de perguntar por ele. A mãe do menino que vive com um novo companheiro, disse não ter mais contato com o pai do garoto. Alexandre só tem uma irmã,de quatro anos, que também não para de falar nele.
- Ela fica dizendo que ele vem, que vai cahegar e que vai buscar o irmão. Os dois são muitos apegados — afirmou Rana.
A presidente da Fia, Cleneuda Magalhães, disse que a fundação está dando apoio social e psicológico para as famílias dos meninos, além de acompanhar as investições da Polícia Civil. Luiz Henrique Oliveira, gerente do SOS Crianças Desaparecidas, disse que o tempo é o principal inimigo no caso dos desaparecimentos.
— Cada minuto de atraso pode dificultar a localização. Cada hora é importante. Por isso defendo a aplicação da lei da da busca imediata — diz, se referindo Lei deferal 11.259, de 2005.
Essa lei acrescenta um dispositivo na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para determinar investigação imediata em caso de desaparecimento de criança ou adolescente.
Em seu artigo segundo, diz que “a investigação do desaparecimento de crianças ou adolescentes será realizada imediatamente após notificação aos órgãos competentes, que deverão comunicar o fato aos portos, aeroportos, Polícia Rodoviária e companhias de transporte interestaduais e internacionais, fornecendo-lhes todos os dados necessários à identificação do desaparecido."
Outra lei, esta estadual, de 2019, determina que em caso de desaparecimentos de menores as delegacias especializadas encaminhem as famílias ao SOS Crianças Desaparecidas para receber atendimento psicossocial.
De acordo com dados da Fia, 76% dos casos de desaparecimentos envolvem conflitos familiares que resulta em fuga. O restante é subtração de incapaz, sequestros, afogamentos e outras situações.
Quem tiver informações sobre os meninos deve entrar em contato com a Fundação da Infância e Adolescência pelos telefones 2286-8337 ou 98596-5296.
Via O Globo